Tempo de leitura: 5 minNo passado dia 4 (portanto este post já vem atrasado) assisti ao Microsoft Solutions Day dedicado ao Virtual Earth, e saí com a sensação de que realmente há algo muito forte em movimento na área de webgis. Uma das principais novidades que ouvi foi o anúncio da revisão ao protocolo entre o Estado Português e a Microsoft, que passou agora a incluir também as Câmaras Municipais no acordo, permitindo-lhes a utilização gratuita do Virtual Earth (exceptuando-se aplicações para fins comerciais: ie venda de algo). Em simultâneo, foi renovada a cobertura da imagem aérea, sendo agora baseada nos ortofotomapas de 2007 e com resolução de 50cm por pixel! Portugal fica assim com uma das melhores coberturas do mundo no VE!
O VE é como se sabe, muito resumidamente, um visualizador da informação geográfica da Microsoft (cartografia base e ortofotomapas) onde por meio de programação podemos sobrepôr a nossa própria informação no mapa. Não me vou alongar aqui na descrição técnica do VE e das suas capacidades, talvez noutro artigo… E outras empresas têm produtos semelhantes, sendo o mais notável o Google Earth e Maps (havendo outros).
Qual é a novidade?
A verdade é que já há muito tempo que os produtores tradicionais de software SIG comercializam produtos deste tipo para publicar e explorar informação geográfica usando um browser via Internet.
Então, qual é a novidade? Que impacto é que podem ter a Microsoft e a Google quando lançam também os seus visualizadores?
É que há 1 factor determinante e que faz uma diferença fracturante em relação ao que tinhamos antes, havendo depois uma miríade de outros factores que ajudam a criar um impacto cada vez maior: informação…
Informação de base e ortos para todo o mundo
Esta é a questão central – já não será necessário adquirir informação geográfica de base! (obviamente que nem sempre será verdade)
Imaginemos uma câmara municipal que decide implementar o seu SIG e começa a colocar as questões habituais:
– que hardware, que software, que técnicos, que informação, que procedimentos?
E qual é a questão mais cara? Isso mesmo – os dados.
Lançar concurso para aquisição de cartografia vectorial e de ortofotomapas para todo o concelho pode custar de dezenas a centenas de milhares de euros, é moroso, complexo, e arriscado. Frequentemente não se consegue obter um produto de qualidade. E depois? Depois continuam as dificuldades: onde armazenar essa informação, como manipulá-la correctamente, como torná-la útil? Quem sabe fazê-lo?
Agora, eliminem-se todas essas questões de uma só pernada: Ao usar uma aplicação baseada em VE, a câmara recebe uma aplicação web que além de ter um aspecto gráfico profissional ainda mostra uma cartografia extraordinária, com nomes de rua actualizados e ortofotomapas de alta resolução. E para terminar o preço é 0! Isso mesmo, zero, nada, zilch!
Hmmm… decisão difícil …
(Atenção que para quem não está incluído no protocolo referido podem existir custos de licenciamento. Há que investigar se somos ou não abrangidos pela licença gratuita do produto que escolhermos.)
Mas não existem grandes limitações e problemas?
É verdade que existem problemas a resolver. Esta abordagem não é uma panaceia para todas as situações. É antes uma nova abordagem a integrar com as já existentes. Há que saber conviver com ela da melhor forma. Por exemplo, é necessário fazer a ligação entre o visualizador e a nossa própria informação. E isso só se faz recorrendo a programação. Simples ou complicada, é sempre necessária. As funções que necessitamos incluir no visualizador e que não venham incluídas de raíz, têm também de ser desenvolvidas à medida. Outro facto incontornável.
Também a impressão é mais difícil. Existem limitações técnicas que é preciso saber rodear, e aprender a aceitar compromissos: se não é possível imprimir tal como se gostaria, então até onde é possível chegar? E isso será suficiente para o meu caso? Eu diria que 90% frequentemente as necessidades de impressão podem ser satisfeitas utilizando visualizadores como o VE. E mais, em aplicações webgis a tarefa de impressão é geralmente muito simplificada.
E se a Microsoft decidir acabar com o VE? Ou começar a cobrar fortunas? Esta é uma questão que não me parece especialmente pertinente. Enquanto nos preocupamos com uma possibilidade mais ou menos remota, desperdiçamos uma boa oportunidade. Se e quando esta situação ocorrer, já teremos usufruido deste sistema durante os anos em que a plataforma esteve activa. Por outro lado, é discutível que todo o software incorre em riscos semelhantes…
Como interligar com a nossa informação?
O que torna um visualizador especialmente útil para cada organização será a sua capacidade de integração com a “nossa” informação geográfica. Existem 2 formas de colocarmos a nossa informação no VE: como imagens ou como vectores.
Para publicar a nossa informação como imagens, é necessário criar uma aplicação que é responsável por ler os nossos dados e criar imagens de mapas com a simbologia que desejamos, sempre de acordo com as regras do VE. Estas imagens são depois sobrepostas à informação do VE usando transparências. Uma pesquisa no Google revela milhares de resultados com exemplos de código para todos os gostos.
Para publicar a informação como vectores, é também necessário criar uma aplicação, mas que converte a nossa informação para um formato aceite pelo VE. Actualmente são aceites os formatos KML, GPX, e o formato próprio do VE.
Aqui também existem problemas para os quais é preciso ajustar a nossa perspectiva… Estes visualizadores usam as capacidades do browser para literalmente desenhar vértice-a-vértice a nossa informação vectorial. E os browsers não oferecem grande performance neste aspecto. Se quisermos representar algumas dezenas de pontos não há problema. Mas se quisermos visualizar o PDM? Ou o cadastro? Ou a rede de águas? Consoante aumenta o número de vértices a desenhar também o desempenho do browser diminui, até ficar inoperante. Podemos optar pela publicação por imagens, mas isso implica perder a interactividade que os vectores oferecem – e.g. colocar o rato sobre um polígono e obter informação adicional. Como sempre, existem soluções também para esta situação (aglomeração, tiles de vectores, generalização, clipping, escalonamento por escalas), e temos que saber explorá-las de forma a obtermos um resultado satisfatório.
Qual o papel do software SIG tradicional?
Uma das discussões que têm surgido frequentemente é sobre o papel das empresas que actuam no mercado de software SIG – ESRI, Intergraph, Autodesk…
Não penso que terão o futuro ameaçado, antes pelo contrário. Acredito que o Virtual Earth e restantes visualizadores vieram abrir novas oportunidades a estas empresas, embora tenham também provocado um enorme aumento de concorrência por parte do sector informático genérico (não SIG).
Isto é, se uma organização pretender implementar uma solução VE, irá procurar quem ofereça esse serviço. E poderá optar não só por uma empresa SIG, mas também por qualquer parceiro Microsoft especializado em Virtual Earth. Confesso que neste aspecto sou tendencioso: acredito que uma empresa SIG oferece vantagens acrescidas, pela experiência e conhecimentos alargados na área – tem contexto!
Ao nível do software também as empresas SIG não ficaram paradas. Uma após outra incluíram nos seus produtos capacidades de integração com as plataformas geográficas dos gigantes Google e Microsoft. Todos lêem o formato KML, que hoje é praticamente o formato universal aceite por todas as plataformas, e alguns conseguem até converter para este formato. Faltará ainda uma boa capacidade de criação e edição de KML… mas lá chegarão.
E recentemente os produtos de servidor começaram a oferecer capacidades de integração com o VE e Google Maps/Earth. Ou seja, em vez de programar aplicações de integração, hoje apenas temos que configurar a forma como queremos publicar a nossa informação para estes visualizadores. E tudo dinamicamente: Se editarmos a nossa informação, ela aparecerá editada no VE. Um exemplo: praticamente todos estes produtos publicam KML directamente a partir dos nossos dados: ArcGIS Server da ESRI, MapGuide da Autodesk, e os principais produtos Open Source – MapServer (por enquanto via plugin), GeoServer, e MapGuide Open Source.
A tendência é assim de alargar a caixa de ferramentas que os técnicos SIG utilizam – o VE e semelhantes são mais uma ferramenta que devemos integrar na nossa actividade profissional.
Conclusão
Assistimos actualmente à trivialização da publicação de informação geográfica para as plataformas de serviços geográficos. E esta capacidade é já um factor diferenciador dos produtos. Quem oferece mais integração, e maior facilidade, tem o melhor produto. Quanto mais estas capacidades aumentam, menor é a necessidade de programar esta interligação tornando-a cada vez mais acessível.
Claro que um departamento SIG que produz cartografia temática de alguma especificidade, executa análises geográficas, e edita informação frequentemente, não pode ser substituído por uma aplicação deste tipo… Um departamento com conhecimento técnico especializado, experiência profissional, e capacidade de execução, não pode ser comparado com uma aplicação webgis.
Nos locais em que não existe uma equipa especializada, e com poucos recursos, a utilização do VE ou GE/GMaps é uma solução rápida e barata para implementar soluções SIG na web. E onde já existe esta equipa, ainda melhor – poderá potenciar a sua utilização em diversas soluções focadas em questões específicas.
Mãos à obra!